quarta-feira, 27 de maio de 2009
A Cerimônia do Adeus
terça-feira, 19 de maio de 2009
Reflexões de Ademar Cobra
"Se for prá acabar, o mundo vai acabar em papel, em cachorro ou em crente. Um deste três. Porque eles só aumentam !!!!"
segunda-feira, 18 de maio de 2009
No princípio era o Verbo
Vamos tentar começar pelo princípio...
São João Evangelista nos diz: "No princípio era o Verbo e todas as coisas foram feitas por meio dele". Concluímos, portanto, que o Verbo nasceu impessoal, sem um sujeito que lhe comandasse a ação ou um predicado sobre o qual pudesse projetar seus efeitos.
O Verbo, pura ação, disse: “Faça-se o existir, para que doravante toda a criação, nova ou antiga, tenha o atributo da existência”.
Por óbvio, antes que o verbo existir fosse criado, coisa alguma existia !!
O Verbo criou nomes e pronomes. Criou o sujeito e disse a ele: “Tu poderás pensar que comanda a ação, mas saiba que nada podes sem o verbo. Estarias condenado ao um estado inerte, sem nada fazer, pensar ou sentir. Ou mesmo abster de praticar qualquer ato. Sem o verbo, sequer sofrer tu podes. Ou ainda sua abjeta existência ignorar. Se hoje te crio é para que mais verbos possam ser nascidos e usados e assim maiores serão os meus horizontes”.
Assim como o sujeito, poderás pensar que comanda tuas ações e teu futuro. Tuas ações, porém, estão escritas pelos verbos que existem muito tempo antes de ti. Não podes agir sem eles ou contra eles. Teu futuro será cada dia menor. O passado e seus tempos pretéritos, este sim crescerá a cada dia, a cada palavra saída da tua boca. Quando tiveres empilhado montanhas de palavras e teu passado for grande o suficiente, nenhum espaço restará para teu futuro.”
O Verbo deu ao Homem a pílula falante e o fez dormir. Fez-se noite e amanhecer.
O Homem acordou com um comichão na língua, nominando tudo o que via, cheirava, tocava, ouvia, degustava e imaginava. E inventou novas palavras e novas línguas. O Homem deu nomes à Lua, ao Sol e às estrelas. E aos planetas visíveis e às luas destes planetas. E descreveu seus movimentos. E assim o Verbo pôde deixar a órbita da Terra.
O Verbo divertia-se e estava satisfeito, e disse: “Faça-se a árvore do bem e do mal, para que os adjetivos sejam multiplicados, e faça-se a vaidade no Homem, para que suas palavras jorrem de sua boca e sejam mais numerosas que as estrelas do céus e os grãos de areia de todas as praias que o mar puder criar”.
Todas as palavras um dia já ditas ou escritas, em seu conjunto, têm valor menor do que um caco de telha. Enfileiradas e amontoadas, gastas como tudo que é por demais usado, podem ser repetidas ou esquecidas, sem que com isso mude algo da matéria que as cerca. O Homem, contudo, deixou de construir, conservar e destruir para abraçar a ilusão de poder mudar a si e ao mundo usando palavras.
E o Homem, tomando para si a função de criador, fez a metáfora. Disse: “Faça-se o pensamento chinês, para que frases tolas pareçam ter a profundidade de um oceano”.
Juntando uma palavra à outra – por crer que juntas devem conviver, por acreditar que falar seja seu veículo no mundo, por gostar menos do ar que invade seus pulmões do que do som produzido por ele quando se vai – o Homem fazia inimigos e desentendimentos, dentro e fora de si. Nesta obra de barroco prosopopeico, o Homem tropeçava em palavras, que só por outras também podem ser explicadas, um novelo de fios embaraçados que jamais será desfeito e essa confusão nunca acaba. Na boca do Homem as palavras puxam uma à outra e jorram em torrente ao abismo, arrastando atrás de si o falante.
E o Homem, de tantas línguas, sentiu-se só.
Lembrou-se da advertência do Verbo. O Homem já não vê o mundo e o mundo não o vê. Apenas as palavras saídas de sua boca projetam-se no mundo em forma de uma parede intransponível, mais alta a cada palavra dita. Busca consolo em outras palavras, pois apenas palavras lhe restam. Um espírito solitário procurando companhia num animal de estimação já morto.
E um homem disse a outro homem:
E fez-se entre humanos a comunicação viável: muda.